Cidadão do mundo, já trabalhou na Espanha, Bolívia, Chile, México, Japão, China; poliglota, fala seis idiomas, além do espanhol: inglês, chinês, francês, japonês, vasco e catalão. Médico, docente, colunista, comentarista mas, acima de tudo, um apaixonado pelo futebol e pelo seu trabalho.
Cidadão do mundo, já trabalhou na Espanha, Bolívia, Chile, México, Japão, China; poliglota, fala seis idiomas, além do espanhol: inglês, chinês, francês, japonês, vasco e catalão. Médico, docente, colunista, comentarista mas, acima de tudo, um apaixonado pelo futebol e pelo seu trabalho. tanto na hora de dirigir os jogadores como na hora de formar os jovens, seja como jogadores ou como treinadores. Foi o treinador mais jovem em dirigir na primeira divisão do futebol espanhol quando, aos 29 anos, tomou a direção técnica do R:C.D. Espanyol na temporada 83/84
Xabier Azkargorta define-se a si mesmo como “uma pessoa que vai colhendo experiências, das mais diversas, no mundo inteiro, tratando de fazer coisas boas, positivas nas que “eu possa deixar algo e ao mesmo tempo crescer como pessoa e como profissional”.
Justamente em uma de suas tantas facetas, sempre com algo ligado ao futebol, foi aí que conhecemos Xabier. O “Bigodão” exerceu a direção de imprensa do Nou Camp durante os Jogos Olímpicos de Barcelona ’92 e o recordamos como um funcionário eficiente, mas acima de tudo, um cara cordial, amável, dispsto a solucionar os muitos inconvenientes que se apresentam nesta tarefa. Lembramos daquele momento e logo conta que “foi uma das grandes experiências para mim, sabe qual era a maior dificultade? Os horários, porque a mesma hora em Barcelona para uns era de manhã em seu país ou de noite, ou de tarde e então tudo devia funcionar corretamente durante o dia todo, foi lindo, de verdade…E sabe de uma coisa? Vou dizer algo que muito pouca gente sabe e vale dizer agora: eu tive a ideia de criar o que agora se chama zona mista…”
– Conmebol.com: Não me diga, que grande invento! Porque sempre foi muito difícil entrevistar os protagonistas, sempre se escapavam…
– X.A.: E não só isso, em torneios internacionais está a questão do satélite, você paga muito por isso e, às vezes, o tempo não era suficiente, você sabe, os jogadores tomam banho, se enxugam, se vestem, se penteiam, ficam nos vestuários e isso leva muito tempo, na verdade, inicialmente a minha ideia era que nesta zona mista, que não era chamada assim na época, os jogadores podiam falar com os repórteres antes de entrar no vestiário, no caminho para o vestuário, mas isto se tornou difícil então criamos essa área para que a saída dos jogadores fosse só por um único lugar e ali poderiam falar com jornalistas…
– C.c.: Como foi que você passou a ocupar esse cargo, no qual fez muito bem por sinal?
– X.A.: Através de amigos, de pessoas que me conheciam no ambiente do jornalismo porque como eu sou um médico, especializado em medicina esportiva, tinha escrito colunas e comentários, e também escreveu para “El Periódico” da Catalunha, comentários durante todo o mundial do México ‘86 e fui comentarista de TV, te conto que estive no Maracanã no jogo Brasil x Chile, naquela vez da bomba do “Condor” Rojas. Eu estava em um momento de dúvida entre continuar na medicina ou na direção técnica e ali veio a proposta para trabalhar nos Jogos Olímpicos e tomei a decisão e fui …
– C.c: E a América do Sul, ou a Bolívia em particular, como surgiu em seu caminho ?
– X.A.: O presidente da Federação Boliviana, Guido Loayza, eu queria fazer algo diferente, queria um técnico europeu e, em seguida, Marco Antonio Etcheverry, “O Diabo” tinha sido transferido para o Albacete e o Presidente Loayza indagou, consultou com gente conhecida para ver se alguém iria querer dirigir a Bolívia e disseram que “o único louco” poderia ser eu …
– C.c: E foi fácil de aceitar “a loucura” quando veio a proposta?
– X.A.: Inicialmente não. Naquela época não havia google ou wikipedia, era mais difícil encontrar informações e até hoje eu me lembro que quando eu comentei com a minha mãe, ela me perguntou: ” Você vai como missionário?”. Na verdade, parecia uma loucura, mas apesar da minha recusa inicial e ante a insistência do presidente da federação, fui pensando até que um dia me perguntei por que não? E a verdade é que eu não me arrependo. Eu aconselharia, recomendaria aos técnicos europeus para vir à América do Sul para treinar pelo menos um ano, aqui está a gênese, a raiz, o berço, o jardim de infância, aqui se aprendem muitas coisas que não se aprendem na Europa.
-C.c.: Por exemplo…
– X.A.: Trabalhar com infraestruturas que muitas vezes não são adequadas ou ideal, com muita precariedade, com deficiências em muitos sentidos, como por exemplo, a parte jurídica e social do jogador profissional, em suma, há muitos detalhes que são muitos diferentes do acostumado a ver na Europa, mas é uma experiência gratificante …
– C.c.: E a chegada, como foi?
– X.A.: Ha! Era 1992, imagine, o quinto centenário do descobrimento e de cara me disseram que os espanhóis estavam chegando com pequenos espelhos para tirar tudo. Lembro de um jornalista que me disse que eu era um “ilustre desconhecido”, e eu disse a ele que talvez ele tivesse razão, mas também ele podia ser um “ilustre ignorante”. Não foi fácil no começo, até mesmo ameaças de morte tive!
– C.c.: Tanto assim?
– X.A.: Sim, vencemos 7-1 a Venezuela, como visitantes, e eu acho que ainda é o melhor resultado fora de casa da Bolívia e ao chegar li uma carta que tinham me entregado antes de viajar e ali estava a ameaça.
– C.c.: Que bom que ganharam, e como foi com os jogadores?
– X.A.: Houve também um receio lógico no início, mas eu fui claro logo de entrada e eu disse que aquele que não estiver se sentindo à vontade tinha a possibilidade de ir embora sem problemas e no final pudemos trabalhar muito bem. Outra história que te conto é da viagem que fiz da Espanha que foi como para desistir no meio do caminho, não chegava nunca, fiz milhares de escalas, parecia o leiteiro…
– C.c.: Tudo foi se ajeitando?
– X.A.: Nem tanto, fizemos um amistoso contra o Chile, perdemos e eu me lembro que diziam: “Vai embora! De futebol você sabe menos que o Condorito!”. Logo, sim, nós fizemos em ‘93 uma boa Copa América, em um grupo duro de rachar contra o Equador, Argentina, Colômbia e México e me lembro que, apesar da eliminação eu disse que estava tranquilo, porque tínhamos jogado muito bem.
– C.c: E isso foi nas eliminatórias…
– X.A.: Sim, ganhamos aquele jogo que te falei, a Venezuela em Puerto Ordaz, 7 a 1 e, em seguida, o Brasil que pela primeira vez perdia nas eliminatórias e a partir daí a autoestima cresceu e vencemos Uruguai, Venezuela, Equador, fomos marcando pontos e conseguimos a classificação para o mundial dos EUA, que foi algo muito bonito.
– C.c: E voltaram a te chamar..
– X.A.: Sim , mas uma coisa deve ser esclarecida. Para mim, desta vez não foram me buscar na Europa, eu estava morando na Bolívia porque o presidente Evo me pediu para ajudá-lo com trabalhos de esporte na parte social, que foi quando me ofereceram a chance de voltar à seleção e trabalhar também na formação de novos jogadores e treinadores e é o que estamos fazendo.
– C.c.: Qual era o seu trabalho específico como embaixador do Real Madrid?
– X.A.: O principal era criar escolas em países fora da Espanha e onde mais trabalhamos nesse sentido foi no México.
– Cc: Xabier, hoje, tantos anos da “loucura” de ter vindo pela primeira vez, qual é o seu balanço?
– X.A.: Totalmente positivo, embora haja ainda muito trabalho pela frente, vamos continuar fazendo coisas, gerando projetos que avançam e às vezes não tanto. Eu acho que a América do Sul em geral tem feito grandes progressos em infraestrutura, em instalações, e estamos insistindo na Bolívia também, é algo fundamental porque são coisas que depois se refletem na hora de competir. Estamos sempre tratando de ensinar, mas também continuamos tratando de aprender.
Robert Singer / Conmebol.com